Sentado
Simplesmente sentado, sem ter um objectivo, uma razão de estar ali
Sentado, de pernas em riste, de braços fechados
Olhos sem ver e escuta sem ruído
Voz deitada no silencio
Sentado ali, sem que nada fosse uma mera circunstância
De corpo duro e pensamento mole
Enfraquecido pela cascata de imagens
Filmes que se constroem em sucessões de frames
Sequencias de firmamento que levam o espírito
E de coração assim, longe de tudo
Fico sentado
Ali, naquele lugar
Como se fosse o ultimo, como se fosse a merda de um grito
De uma revolta, de uma puta de vida sem sentido
De uma fúria que não sai deste peito que pede para explodir
E ali
Sentado, fodas, como posso estar assim?
Só sentado é que não vejo
Não revejo o passado, nem observo o futuro
Sentado nem o presente me fica aos pés
Mas sentado sei que morro
E a mente leva-me ao buraco
Aquele túnel sem saída, sem caras, faces, lábios ou olhos
Apenas fantasmas que vem e vão mas ficam sem pedir
E ali fico sentado
Esperando não sei o quê
Talvez aquela dor que nunca se sabe se dói
Ou aquela frustração que não sai
Entrou como seta e ficou por ali a sangrar
E assim espero sentado
Que a história possa escrever outra vez este nome que até esqueci
E todos já nem sabem que eu estou aqui
Sentado.
Não
Não
Não
Quantas vezes tenho de dizer que de sentado estou farto
E daqui desamarro aquelas cordas que deixaste
E liberto todas as correntes que ataste
Já não sou teu servo
Nem mesmo um mero criado dos teus devaneios
Sou apenas uma fracção de existência
Mas mesmo que um segundo que seja, sou tempo e sou parte
Ínfima migalha de tudo
E tu, mera recordação
De um corpo sentado
Esperando aquilo que não se espera
Sem que antes
Se consiga dizer que não
À vida sentada.
A ti,
Que não passas de uma mescla de pensamentos
Deixo-te ir
Algures
Do meu sentimento
Que não se ressente do que me fizeste
Porque fui eu quem te deixou entrar
E abraçei-te ali, naquela cadeira
Onde um dia pensei estar sentado
E agora
É apenas o principio de saber dizer que não
Não quero estar sentado,
Antes caminhante do que reles pobre na cadeira.