podes pensar, podes falar, mas tudo o que escrevas tem o poder de ficar.
11 de Abril de 2016

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Porque cai um homem? O que faz um homem em queda? Grita? Sustem a respiração, contraindo os músculos, para mais rápido desfalecer? Sente o corpo deslizar e faz uma revisão em flashes, de toda a sua breve existência enquanto ser vivo? Clama aos céus por uma ajuda divina? Olha em volta e procura o sentido para o derribamento, para aquele momento decrépito e avassalador? O Abismo é uma curta fronteira entre o início do fim e o fim de si mesmo. Dar o passo, perder do pensamento o receio da consequência, não vislumbrar o que fica ou como fica, apenas centrar na efêmera passada para o vazio, onde os pés já não sustem o corpo, onde a consciência deixa de fazer sentido, onde o esquecimento ganha sobre as memórias, onde o nome se torna pó e o corpo vento. Procurar respostas na queda é encontrar ainda mais perguntas. E o corpo? Qual a sua posição, quando cai? Qual o seu peso, a sua massa física? Pernas que se perdem no ar, braços que apenas caem, perdem a força humana, o músculo. A cabeça é uma caixa de Pandora de pensamentos. De repente, nascem como pequenas sementes, atrofiados durante anos, e que agora brotam, sem nexo, apenas formatando perguntas: Porque é que teve de ser assim? Porquê eu? Que dirão os que esperavam mais de mim? Haveria outra alternativa? Como foi isto tudo acontecer? Porquê Deus? E se...? Seria diferente se...? Merda, porque é que tinha de estar à hora errada no lugar errado? Listas e listas contínuas de questões que se atropelam na cabeça, procurando explicações para o sucedido, sem que elas possam alguma vez evitar, ou voltar atrás, e corrigir o que foi feito e o que está a acontecer. E o corpo, cai de costas ou de frente? Poder-se-á escolher como se cai? Controla-se o corpo, na luta contra a gravidade, a força centrifuga? A queda é igual em todo o seu sentido, em todo o seu momento. Neste ensejo podia haver a sensação de Super-herói, transformar o casaco numa capa multicolor, como nos filmes animados que percorreram a nossa vida de miúdo, onde o corpo flutuaria como uma pena, deixando de ser peso em força, sempre a descer, e conseguir assim controlar movimentos, escolher direcções, para cima, para baixo, para o lado esquerdo ou direito, em diagonal. Conseguir dominar a vontade do indomável e contornar a perspectiva do destino. Super-herói seria regressar ao ponto de partida, pegar em todos os que olham o Abismo, sorrir-lhes como sinal de esperança e levá-los para um lugar seguro, longe daquele inferno absurdo. Podia ser uma casa de família, os braços da pessoa amada, um sorriso de um filho que o aguarda, os lençóis de uma cama que o resguarda. Ou sair no voo celeste do espaço, atingir as estrelas, e no infinito mudar o sentido do planeta, capacidade de tornar o passado em presente, viver o antes de acontecer, sabendo que iria acontecer, mas evitar que acontecesse, e assim prevenir, o embate, explosões, quedas, gritos que ficam perdidos, corpos que não tem posição exacta quando caem. Esse seria o tempo de Super-herói, o mesmo que conseguiria evitar a queda. E assim, nada teria acontecido, nem mesmo o que seria escrito, naquelas folhas brancas, que caem como corpos perdidos, no abismo da verdade. Como se pode evitar a queda? Escrevendo que não se cai? Quando se cai, não se pode descrever outra coisa, é o firmamento da descida… mas até onde se pode e se consegue descer?"

publicado por opoderdapalavra às 14:22
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Grata, sorrisos :o)
Quente.Arrebatador.
Leitura muito agradável :)Convido a leitura do meu...
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