Alguém te contou o que te espera do outro lado?
Não. O que há desse lado para onde vou agora?
Pessoas. Gente aos milhões, enjauladas em cidades, presas em guetos mentais, absorvidas pelo poder, pela ganância.
Mas… eu tenho mesmo de ir? Gosto tanto de estar aqui. Pensava que ia para algo melhor.
Mas tens de ir, todos temos de ir, faz parte do plano. Mas quero que me prometas uma coisa.
O quê?
Que não vais deixar de sonhar.
Prometo.
Então agora vai e sê criança. Sê feliz.
Vi-o partir como os vi a todos. E todos me prometeram o mesmo, e todos não cumpriram o que prometeram. Fico sempre a pensar, a sonhar que um dia, um deles, vai de facto cumprir com o prometido. Olho-os e vejo-os crescerem com toda a energia de crianças imbuídas pelo prazer de brincar, de aprenderem e apreenderem com os momentos. Observo que são ingénuos, ignorantes, mas tiram partido disso, descobrindo, alheados dos vícios dos mais velhos. Mas depois tornam-se adolescentes, começam a quererem construir uma personalidade, nenhum mal nisso, mas quando se tornam adultos, caem no esquecimento:
Esquecem-se que foram crianças,
Esquecem-se de brincar,
Esquecem-se de gostarem uns dos outros,
Esquecem-se da pureza, da singela ideia de apenas existir,
Esquecem-se da amizade, do amor, da verdade,
Esquecem-se da solidariedade, da entreajuda,
Esquecem-se da família,
Esquecem-se afinal deles,
E pior, esquecem-se de quem lhes proporciona a oportunidade… a vida.´
Mas espero, aqui, sentado no lugar de sempre, que um dia, muitos deles possam crescer sem se esquecerem, e assim poderem construir um mundo que nunca se desligue do essencial, o dever de viver, e de ser sempre criança, porque assim poderão de facto, voltar a ver o mundo como um belo jardim de brincadeiras sem ferir ninguém…