Sentado naquele banco do costume. Olhando o lago do costume. As mãos nas pernas do costume. O cheiro das castanhas que vem queimadas, daquela banca de vendas do costume. As folhas que vermelhas e amarelas, caem das árvores do costume. O vento que chegou do norte, trazendo o frio do costume. O relógio da torre que mantém o andamento do costume.
Parece que a vida se tornou uma rotina do costume. Sem nada de novo, tudo se mantém, como de costume. Estas rotinas trazem-me a saudade. A lembrança de em pequeno, correr sem parar, como se o mundo tivesse um horizonte sem fim. A memória de em pequeno, saltar sem cansar, como se o coração batesse até ao infinito.
Em pequeno também não via a mesma árvore, nem notava no mesmo lago. Parecia sempre tudo diferente. Até a água que vem do riacho e preenche aquele enorme lago, conseguia perceber que as goticulas tinham sempre um mover diferente, nunca as mesmas do costume. As árvores tinham ramos mais pequenos um dia e crescidos no seguinte. As pessoas eram ora mais risonhas ora mais tristes, mas nunca mais ausentes como agora, sempre como de costume.
E agora, após estes anos diferentes, tudo é tão igual. As horas, os dias, as semanas, os anos. Levanto-me, como de costume, pelas 10. Sempre com uma pergunta a rondar os pensamentos, o que terá de diferente este dia? E como de costume, tomo um banho quente, visto quase sempre os mesmos padrões e como de costume, como a torrada e uma chávena de café quente. Nem chego a variar o complemento daquele pedaço de pão. Manteiga, magra e de pouco sal. Até a marca, como de costume, escolho sempre a mesma. Saio e percorro as mesmas ruas até ao parque. De dia para dia, encontro-me com pessoas sempre em corrida, despojadas de sensações, coladas a telemóveis, freneticamente ligadas a um stress drogado. Vejo poucos sorrisos, como de costume, e muitas faces sérias, enfiadas num baixo olhar e em lábios contidos. Chego a chocar com pessoas cegas, que invariavelmente não me veem, como se me tivesse tornado invisível. Nem se conseguem ver a si próprias, como de costume. O que diferencia esta caminhada são as lojas. Situam-se no mesmo firmamento do costume, mas as que estavam ontem abertas, nem sempre são todas as que hoje se abrem de novo. A barbearia do Zé fechou faz duas semanas. Cortei ali o cabelo, durante anos e anos, como de costume. Mas isso já não existe hoje. Ou a mercearia da Antônia, que não aguentou a ausência de gente, e morreu um sábado pela manhã, deixando-me à porta, esperando por comprar um pacote de açúcar para o café. Escutei, como de costume se escutam as más notícias, que não suportou as lágrimas da solidão, de uma loja vazia, da falta de palavras, conversas, dizeres e cusquices da vida alheia.
Em pequeno as ruas eram todos os dias diferentes. Rodava a bicicleta pelos mesmos lugares, mas reparava sempre em algo de novo. Como se nunca ali tivesse estado anteriormente. Tinha outros olhos, outros sorrisos e outras atenções. Mas agora, como de costume, a rotina cai sempre sobre os ombros. E pesa. Pesa tanto que faz dor. Uma dor que traz, como de costume, a falta de vista. Fica-se tão curvo que não se vê para lá do chão. Sei que o céu mantém-se de azul e as nuvens de branco. E sei que algures pela noite, lá em cima, apresentam-se as estrelas, como de costume. Mas apenas as cores do chão e do rasteiro, como de costume, se tornaram a minha companhia.
Como de costume, já não sei o que a vida trará de novo. Perdeu-se a novidade, padeceu lá atrás no tempo, o mesmo que identificamos na desculpa de nada de novo fazermos.
E assim me deixo estar. Como de costume, no mesmo banco, onde me acostumo a esperar.