Imaginem que um dia, numa estrada qualquer, no local perdido algures no tempo, e onde nada pudesse prever tal, encontram uma árvore isolada. Rodeada de terra árida e repleta de uma cor vermelha, cheiro a um seco que queima toda a respiração, e um horizonte perdido nas ondulações de calor. E aquele pedaço de madeira, encrostada no solo, mantinha-se ali, perante o vosso olhar. Sem folhas, apenas uns três ramos, meio caídos, desfilando uns buracos de térmitas. Vocês eram um corpo de cara espantada, criando perguntas na mente
Como sobrevive uma árvore a este deserto?
Porque estou eu tão maravilhado por este pedaço de madeira?
E tentam-se a abraça-la. Assim, sem mais demoras, lançam os braços em volta dela, e encostam a cara na temperatura do tronco. Está quente, mas vocês aguentam. Sentem arrepios na pele, sinal de que esta está a estabilizar a elevada febre que sente a árvore. Fecham os olhos. Respiram devagar. E deixam-se ir na imaginação…
Já não estão num deserto. Agora sentem o fresco da brisa, o som da água que corre pelo ribeiro, o cheiro da erva molhada, e os vossos olhos contemplam as folhas verdes e grossas que vários galhos da árvore sustentam. Estão num vale formoso, porque todos assim o parecem ser. Estão numa estação longe de temperaturas que vos isolam numa caldeira. Estão na mesma abraçados à árvore. Ela mantém-se firme no seu solo. Mas agora escutam ainda o som melódico de pássaros que passam e ali deixam os seus ninhos. Há ainda abelhas que emolduram a sua colmeia numa das pontas da árvore. E por fim formigas trepadeiras, que formam um caminho pelo tronco acima. Há harmonia, simplicidade e formusura. E voltam a fechar os olhos e deixam-se ir novamente no barco da imaginação…
Acordam com o frio de um pedaço de neve que cai da árvore. Os vossos pés estão cobertos pelo branco que cobre toda a vossa visão. Despareceu o vale, deu lugar a uma montanha, ou uma escarpa, pouco saliente, que desce aquele monte. E onde apenas a vossa árvore se sustem, num chão rochoso. A neve vem com o vento, que sopra com a força de um dominador. Sentem que agora o que vos agarra é o tronco da árvore. Os vossos braços tornam-se mais abraçados a ela. E voltam a fechar os olhos. Esperam que a vossa imaginação vos tire daquela vertigem que assusta…
Já não neva. Apenas caem folhas multicolores, pintadas finamente pela natureza. São vermelhos que se confundem com amarelos, e os roxos com os castanhos. Há um odor a melancolia que preenche todo o quadro. As aves passam pela copa da árvore, em bandos, voando para longe, migrando. Sente-se que é hora de recolher comida, lenha e um pouco de memória, para guardar tudo o que nos emociona e assim preservar do frio que parece querer chegar. Vem encostado às primeiras gotas de chuva que vão caindo, dando mais solenidade à queda das folhas. A árvore vai ficando despida. Os ramos estão tristes, esfriados. E vocês suspiram. Estão num prado, onde os homens fecham os animais, apanham as castanhas do chão, e armazenam as bolotas. Comida para o gado. Vocês querem ficar mais um pouco, em lembranças, e libertam os braços do tronco. Encostam o corpo à árvore e fecham os olhos. Agora a vossa imaginação leva-vos ao passado. Enquanto ela navega pelas recordações, a árvore abraça-vos no seu sopé, e deixa que fiquem ali, longe do presente, apenas sonhando. O futuro estará para chegar, mas a Vida liberta ainda um sentimento… o passado ficou lá atrás, e independente da estação, vocês sabem que uma árvore estará sempre à vossa espera ora para vos proteger, ora para vos envolver na sombra, ora apenas para vos ensinar que a vida afinal é sempre bela, qualquer que seja o estado do seu tronco…