Hoje o meu menino virou homem. Deixou de ser aquele pequeno que sorria ao fim da tarde, encostado à árvore, das poucas que ainda conseguem sobreviver ao desnorte da seca e do calor intenso das terras de Munimaka. O meu menino deixou de ser homem por ordem da cultura do seu povo, dos costumes de querer casar menino de rua, menino que corre de pé descalço e que brinca com berlinde de pedra. Menino que sonhava, menino que dançava na utopia de crescer ainda menino, tornar-se rapaz e um dia ser homem. Mas ele já virou homem, ó mãe de todos. Podia virar bicho do mato, fugir pela estrada e não deixar rasto, podia virar menino esperto, com conhecimento para dar aula nos meninos do futuro, podia ser menino que virasse esperto de futuridade e ser cientista, daqueles que descobrem coisas bonitas para todo o outro menino que deslumbra no aprender.
O meu menino virou homem, e estou triste por isso. Queria vê-lo abraçar a professora, de contente, vestir a camisola que escolhi para ele, o chapéu que tem símbolo lá de longe, de onde os meninos tem tudo e não fazem nada, ver aquele sorriso que me ensina mais do que me prende, ouvir aquele palavra que me arrepia o osso e me joga no barril das emoções, e pegar-me na mão enquanto eu choro de alegria por ver o meu menino, o que não é meu, mas é meu amigo e eu dele. Mas quis a vida que ele virasse homem, longe de mim, no tempo em que os meninos perto de mim pensam ser donos do mundo que não lhes pertence, que pensam que sonhar é coisa fustigada de velho, que pensam em serem patrões em vez de pensarem ser o trabalhador que forma o patrão, que pensam serem reis sem reino mas com posse de rei. E o meu menino nem sabe ainda o mundo que existe muito para lá da estrada, que não é apenas uma estrada, mas são várias, são rios e riachos, são mares e oceanos, são montes e montanhas, vales e planícies, que o mundo tem luzes a piscar, tem apitos a sobrar de barulho e tem pessoas que correm como as gazelas que atravessam os prados da savana, e que lá, nesse mundo longe, existem coisa de criança, de menino como ele, que se chama brinquedo, coisa de brincadeira fácil e divertida, coisa que o meu menino não sabe que existe, coisa que ele perdeu, um dia, apenas porque não nasceu no mundo lá longe, onde os homens são-no mais tarde do que os 15 anos em que o meu menino foi obrigado a casar, e se assim, sem saber, sem descobrir o mundo que palpita para lá do seu olhar, sem descobrir o ensino da professora que queria ajudar, sem conseguir ser o rapaz que muitos atingem ser e que nem sonham que são privilegiados de uma vida que parece escolher apenas alguns, mas que poucos são os que querem descobrir a verdade de ser menino, depois rapaz e um dia, tarde, ser homem, como o meu menino, acredito muito nisso, teria mesmo gostado.
O meu menino já é homem, e eu estou triste. Que sejas feliz, talvez já o foste, no mesmo sorriso que me deste, nesta foto que guardo, de fronte para os meus olhos, diante do meu coração.
Obrigado Agostinho. Até um dia, mesmo que sejamos meninos de novo.