podes pensar, podes falar, mas tudo o que escrevas tem o poder de ficar.
31 de Maio de 2012

     

 

 

 

Alguém te contou o que te espera do outro lado?

Não. O que há desse lado para onde vou agora?

Pessoas. Gente aos milhões, enjauladas em cidades, presas em guetos mentais, absorvidas pelo poder, pela ganância.

Mas… eu tenho mesmo de ir? Gosto tanto de estar aqui. Pensava que ia para algo melhor.

Mas tens de ir, todos temos de ir, faz parte do plano. Mas quero que me prometas uma coisa.

O quê?

Que não vais deixar de sonhar.

Prometo.

Então agora vai e sê criança. Sê feliz.

 

 

Vi-o partir como os vi a todos. E todos me prometeram o mesmo, e todos não cumpriram o que prometeram. Fico sempre a pensar, a sonhar que um dia, um deles, vai de facto cumprir com o prometido. Olho-os e vejo-os crescerem com toda a energia de crianças imbuídas pelo prazer de brincar, de aprenderem e apreenderem com os momentos. Observo que são ingénuos, ignorantes, mas tiram partido disso, descobrindo, alheados dos vícios dos mais velhos. Mas depois tornam-se adolescentes, começam a quererem construir uma personalidade, nenhum mal nisso, mas quando se tornam adultos, caem no esquecimento:

Esquecem-se que foram crianças,

Esquecem-se de brincar,

Esquecem-se de gostarem uns dos outros,

Esquecem-se da pureza, da singela ideia de apenas existir,

Esquecem-se da amizade, do amor, da verdade,

Esquecem-se da solidariedade, da entreajuda,

Esquecem-se da família,

Esquecem-se afinal deles,

E pior, esquecem-se de quem lhes proporciona a oportunidade… a vida.´

Mas espero, aqui, sentado no lugar de sempre, que um dia, muitos deles possam crescer sem se esquecerem, e assim poderem construir um mundo que nunca se desligue do essencial, o dever de viver, e de ser sempre criança, porque assim poderão de facto, voltar a ver o mundo como um belo jardim de brincadeiras sem ferir ninguém…

publicado por opoderdapalavra às 21:32
30 de Maio de 2012

   

 

 

Alguém me diz onde fica a porta de saída?

Aquela brecha de vida por onde podemos escapar desta alucinação de autómatos, robots ligados ao desespero dos dias amarrados, das horas contadas ao minuto do segundo que já passou e nada se viveu.

Alguém me pode dizer onde ficaram os sonhos?

Aqueles que um dia me ensinei a ter, com castelos em lugares distantes, cavalos tratados e robustos que percorriam os prados esverdeados, as princesas que vinham e sorriam espontaneamente, onde o algodão ainda era doce e as árvores podiam dar-nos o mais doce dos chocolates, e onde eu gritava no eco persistente de paisagens deslumbrantes. Aqueles que nos transportavam por ideias que revolucionariam o bem da humanidade, que trariam a cura e o fenómeno faminto de bem-estar a todos e a tudo.

Alguém me pode dizer onde está o homem?

Aquele que um dia lhe foi dado a oportunidade de ser alguém, inteligência mais desenvolvida, aquele que construiu uma evolução natural, que arrepiou ideias, filosofias, descobriu-se e reinventou-se, o mesmo que traçou futuros auspiciosos, que procurava querer ser melhor no seu todo… é que leio as folhas da história e ele parece ter adormecido algures no tempo, nem sei em qual, pois já estou tão poluído com a versão actual que quero pensar e não sou permitido, tal a amputação dos pensamentos.

Alguém me pode dizer onde é afinal o botão que desliga tudo isto?

 

SILÊNCIO.

 

 

 

 

Queria apenas parar e poder olhar o céu e vê-lo como ele o é, um céu, um manto de azul, nuvens que vêm e vão, que descobrem o sol e a seguir o encobrem. Queria ver as plantas pela sua cor e não pelo seu decore, sem o preceito de elas mesmo, saberem onde podem viver e desenvolverem-se.

Queria ser de novo criança, esquecer que existe conhecimento e ser eternamente ingénuo no mundo dos Homens, assim talvez conseguisse apenas sobreviver, tal como o faço… sem os sonhos…

 

 

SILÊNCIO.

 

Já encontrei a porta de saída… vou embora, não quero mais estar aqui, cansei-me… talvez um dia volte, talvez possa ser de novo gente, talvez possa ser de novo sonhador e construir… mas não, se voltar, prefiro ser simples luz que navega pelos fins do mundo, deste mundo que um dia foi simplesmente sonhado, por todos…e para todos.

publicado por opoderdapalavra às 22:08
09 de Maio de 2012

 

 

E naquele dia choveram flores. Não foram gotas de água pura, evaporada dos lagos e oceanos ou transpirada das árvores e arbustos, mas sim flores, milhares delas, margaridas, crisantos, malmequeres, rosas ou girassóis. Choveram, cobrindo a terra de um colorido nunca avistado por aquelas paragens, onde o perfume intenso se arrastava por quilómetros e quilómetros sem parecer que parasse. Olhar o céu repleto de flores que dançam pelo decore de nuvens cinzas, carregadas de um negrume arrepiante, é um sentido inigualável. Criou um certo sentido inverso do planeta, uma sensação de que o céu virara jardim e a terra um carregado e escuro céu.

A pergunta “ de onde vêem estas flores todas?” correu o pensamento de todos os habitantes da cidade. Uns benziam-se, apregoando rezas de espantar maus espíritos; outros estavam tão boquiabertos, que até as pétalas mais pequenas eram engolidas; havia aqueles que fugiam, refugiando-se dentro de lojas e casas, assustados com a possibilidade de saírem feridos de algum amasso de flor, chegando mesmo a gritarem aos que passavam nas ruas, observando aquele maravilhoso fenómeno.

publicado por opoderdapalavra às 23:30
08 de Maio de 2012

 

 

 

Dois homens encontram-se no acaso de um lugar. Sem se conhecerem, cruzam-se, nem se tocam. Não sabem que o outro existe, quanto mais o seu nome, a sua identidade. E de seguida, encontram mais dois homens, que também se cruzam, sem se conhecerem. Serão agora mais quatro homens, que no acaso de um lugar, ligam-se sem saberem que os outros existem, quanto mais pensarem que tem um olhar, pensamentos, ideias e acções. E com estes quatro homens, mais dois homens se cruzam, no desencontro do conhecido, porque apenas não se tocam, agora que são seis homens, que não se conhecem, sem saberem da existência dos outros, se tem mulheres, filhos, emprego ou mesmo uma dor, simples, mas que doa e só remoa. Muitos mais homens se cruzaram naquele lugar, no acaso do momento, sem se conhecerem, sem saberem que os outros todos, por mais milhares, milhões e infinitos que sejam, possam existir, mas no entanto todos eles cruzam-se com outros que desconhecem, mas que estão ligados, pelo lugar, pelo ar, pela luz, dia ou mesmo noite, enfim, cruzam-se pelo acaso, no acaso que os caminhos levaram.

Existem 7 mil milhões de habitantes no planeta. 7 mil milhões de pessoas, numero que se cruza no sentido do tempo, pois com 7 mil milhões de passos, daríamos a volta ao planeta, 133 vezes.

Juntamos os 7 mil milhões que somos, uns ao lado dos outros, e abraçaríamos a cidade de Los Angeles.

Todos os dias nasce o sol em parte e adormece a noite na outra parte, mas no mesmo momento, no mesmo segundo em que tudo decorre, nascem 5 pessoas e morrem 2, e milhões ligam-se entre si, muitos deles, a maioria deles, sem saberem que ficam cada vez mais ligados uns aos outros.

Todos os dias, fios são conectados entre vidas, momentaneamente ou eternamente, fracções, com palavras ou silêncios que nos levam a abstrair do sentido, do significado, de olhos fechados que não vêem, e assim não captam a mensagem, a razão, a tal resposta, em que se percorre vidas em busca da explicação.

publicado por opoderdapalavra às 22:48
02 de Maio de 2012

 

 

 

Faço de conta que acordei. Despertei para um novo olhar, aquele que vem com a bruma de uma madrugada de cheiros intensos, envolta em cores cinzas, com aves a navegar pelos céus, os primeiros arrebitos de um galo, os olhos sonolentos do padeiro, da senhora da fruta e do senhor que apanha as verduras frescas, ainda molhadas pela humidade dos fins da noite. Assim é que eu acordo, ao fazer de conta que os meus olhos se abrem. Posso então tocar o céu, imaginando ser um voador, asas em espada, grossas e rijas, saídas das minhas costas, bem firmes. Faço uma roda no ar, de braços abertos, desenhando um circulo, olhando os prados lá em baixo, e junto-me aos falcões, num voo planado, sem bater de asas, apenas sentindo o vento na cauda e deixando que o corpo seja uma linha do horizonte, assim, avistando o que o mundo nos trás para lá do sitio onde o sol dorme.

Faço de contas que sou marinheiro, solto velas pelo vento, pano quebrado em libertas ondas que dançam com as rajadas de um sopro que do norte traz o frio arrepiado. Vejo as baleias emergirem dos fundos do oceano, trazem as crias, mostrando-as a quem passa, e golfinhos ávidos de uma brincadeira de saltos e soltos de jactos de água salgada.

Faço de contas que apenas vejo, que sinto, que sei o que é a sensação dos que são, dos príncipes, dos que montam cavalos de espadachim, dos fins cheios de amor e dos vivem em terras bem, bem longe.

Faço de contas, mas penso, será fazer de contas mais verdadeiro do que os que apenas fazem de contas que existem, os que procuram nas contas o que fazerem, e fazem contas para poderem apenas serem… o que não são.

Continuo a fazer de contas… agora, agora sou um simples azinheiro, plantado em terrenos doceis, abraçado por longos relvados, repletos de flores multicolores. Assim sou, sonhando.

publicado por opoderdapalavra às 22:49
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